DE PALMA (2015)

Nunca foi o meu preferido dos "movie brats", mas é inegável que o De Palma filma muito bem. Vocês sabiam que o primeiro filme do De Niro foi realizado por ele? Eu não!

LET THE RIGHT ONE IN (2008)

A primeira vez que ouvi falar sobre este filme foi numa palestra do Robert McKee na FNAC do Chiado, que precedeu o primeiro seminário que ele deu em Portugal. Ele elogiou o filme, dizendo que tinha sido dos últimos que vira que, no final, o fizera soltar um "uau". Seria injusto revelar todos os seus segredos aqui para quem não viu, mas é um filme que continuo a apreciar, principalmente pela forma como administra o subtexto ao longo de toda a sua duração. Adiantaria o seguinte: o resumo que se fez na época — "Twilight feito por Bergman" — é muito redutor: precisaria incluir o Sternberg de "O Anjo Azul" também.

SCORE (2016)

Gosto sempre de ver documentários sobre a área em que trabalho para descobrir coisas novas sobre artistas de que gosto — mesmo que essas coisas sejam apenas coisas como "Hans Zimmer era o tecladista dos The Buggles".

Assinei a Carta Aberta pelo cinema e audiovisual portugueses

Apesar de trabalhar no Brasil há dez anos, continuo a considerar-me, agora e sempre, um guionista português. Por isso, acompanhei a discussão sobre "a morte ou a salvação do cinema português" que ocupou as redes sociais nos últimos tempos. Já se falou muito sobre o tema e vou tentar não me estender.
Este artigo do Diário de Notícias é bem claro ao delinear o problema — que, para começar, não parece assim tão problemático, já que o ICA terá mais 5 milhões de euros anuais para apoios (30% do seu orçamento atual). 
A questão que sobra, como muito bem resumiu o João Nunes, é se o dinheiro adicional recolhido de plataformas sem publicidade, como a Netflix e a HBO, "deve ser redistribuído pelo ICA ou elas devem poder optar entre dar ao ICA ou investir diretamente em produtores independentes portugueses?". Sublinho o "podem optar"; nem isso é automático.
Lembrou-me a lei das quotas brasileira, que impôs um número mínimo de horas de programação independente nacional no "prime time" dos canais de cabo. Na época em que ela foi implementada, fui entrevistado por um jornalista português. Ele disse-me que a ideia também estava a circular em Portugal e «há quem ache que isso significará uma invasão por programas de qualidade menor». Repito o que respondi então: nenhum canal tem interesse em comprar programas de qualidade menor apenas para cumprir quota. Se uma produtora independente entregar um programa com resultado insatisfatório, o canal vai simplesmente contratar outro programa de outra produtora no ano seguinte. As produtoras sabem disto e, por isso, ninguém vai desleixar o resultado final por causa de uma quota. O efeito da lei foi incrível e o audiovisual brasileiro beneficiou-se muito dela até à era de Bolsonaro, mas isso é outra história.
A discussão em Portugal é diferente, eu sei, mas as suas consequências podem ser bem parecidas. Quantos mais clientes, maior o setor do audiovisual. Um projeto pode rodar e interessar quem não interessou antes. Mais produtoras podem surgir, alargando o circuito além de duas (que, na verdade, são uma) cidades portuguesas e contando histórias com géneros e pontos de vista diferentes daqueles que têm prevalecido, o que me parece sempre ser a chave para atrair públicos maiores e mais diversos. Como minhoto, é algo que me agradaria muito.
Repare-se que isto não seria uma grande questão se o ICA cumprisse cabalmente o papel de construir um mercado audiovisual forte, variado e amplo. Como podemos saber se o fez? Aqui entra o texto magistral do Luis Campos, fruto da sua pesquisa para uma prometedora tese de doutoramento. Chamou-me particularmente a atenção este trecho: «entre 2004 e 2019, (...) [num universo de 2090 empresas], mais de metade dos montantes atribuídos (53%) ficaram concentrados na actividade de apenas 10 produtores, sendo que 20% do total do dinheiro atribuído ficou concentrado na actividade de apenas dois produtores». O total de entidades beneficiadas em 15 anos é de 202, menos de 10% do setor. Parece muito pouco, mas é o suficiente para responder a pergunta no início do parágrafo. 
É muito normal que questões deste tipo caiam no tudo ou nada. O ICA é importantíssimo para o audiovisual português e é por isso que a sua atuação é merecedora de discussão. De certa forma, todos querem o mesmo: que o setor cresça pujante e saudável. Eu considero que esta lei é um bom começo.

MARTIN EDEN (2019)

Este é um filme sobre individualismo e, ainda que não seja o mais importante, fico pensativo sobre se é um elogio ou uma advertência. A transformação súbita da personagem no último ato custou-me a engolir: não entendi muito bem como é que um proletário, de repente, parece o Ozymandias do Jeremy Irons. As referências literárias dão pistas, enfim. A forma é o que torna este filme intrigante, com o uso de planos de filmes antigos enquanto elemento e a sua construção enquanto objeto extemporâneo, que adapta um romance de 1909 com uma linguagem visual que às vezes lembra o neorrealismo e outras as montagens cinematográficas dos anos 80. Deixou-me com muita vontade de ver os outros filmes do realizador Pietro Marcello.

WE ARE WHO WE ARE (2020)

Nunca fui o maior fã de Luca Guadagnino, e parece-me que aqui ele sofre o mesmo problema que o seu conterrâneo Paolo Sorrentino sofreu quando desenvolveu "The Young Pope": a dificuldade de passar dos ritmos próprios do Cinema para a linguagem televisiva, que pede um estímulo constante (ainda que não necessariamente narrativo) e ganchos mais fortes. O primeiro episódio é desconcertante e marca pela originalidade, mas depois reina uma sensação estranha, como se supusesse que o grande ponto de interesse fosse um realizador a fazer exercícios de estilo autoral. Isso não é suficiente. Se os próximos episódios me fizerem mudar de ideia, eu aviso.

THE TWILIGHT ZONE (1959)

Tenho andado a ver a série original e a confirmar o seu estatuto de canónica. Os episódios têm meia hora, 8 a 10 cenas se tanto e não mais do que 3 ou 4 personagens principais. Ainda assim, com tão pouco, faz mais do que muito boa gente hoje, o que me deixa a pensar se não devemos considerar o teatro e, mais especificamente, a radionovela como a raiz fundamental a partir da qual deve entendida a ficção televisiva. A primeira temporada de 1959-60 começa lúgubre e trágica, termina cómica e fantasiosa e lança pistas para toda a ficção científica (e talvez não só) que se fez depois. O episódio "The Monsters Are Due on Maple Street" deveria ser ensinado no mundo inteiro em aulas de Educação Cívica.

RATCHED (2020) e ONE FLEW OVER THE CUCKOO'S NEST (1975)

Pode ser por "American Horror Story: Coven" ter esgotado a minha paciência para o Ryan Murphy, pode ser por ver os mesmos trejeitos narrativos e estilísticos a repetirem-se série após série, mas não acho que esta nova enfermeira Ratched seja comparável à personagem nada glamorizada e esvaziada de compaixão que Lousie Fletcher interpretou no filme clássico de Miloš Forman. Nalgumas coisas, definitivamente, menos é mais.

REPO MAN (1984)

Há dias, li sobre algum filme a crítica de que “tinha ideias demais”. “Repo Man” também tem. A sinopse do filme na Wikipedia descreve-o assim: «a 1984 American science fiction black comedy film (...). Set in Los Angeles, the plot concerns a young punk rock enthusiast who is recruited by a car repossession agency and gets caught up in the pursuit of a mysterious Chevrolet Malibu that might be connected to extraterrestrials». É muita coisa, cada uma mais inaudita do que a outra. Porém, por alguma razão, o filme funciona muito bem. Talvez seja o fato de tudo ser muito divertido e ter ótima música como fundo, mas eu acho que é porque ele deixa as ideias passarem sem se acumularem, transpondo o absurdo da sua premissa para a construção da sua própria narrativa. Às vezes, seria muito fácil dizer “isto não faz sentido algum”, mas isso seria cair na sua doce armadilha. É como se o filme nos dissesse “eu posso levar-me a sério – mas vocês não”. Não vejo a hora de o ver outra vez.

REAL LIFE (1979)

Uma bela comédia de Albert Brooks que, de certa forma, prevê o que seriam os caminhos futuros da “reality TV” numa época em que o único exemplar era a série seminal “An American Family”, da PBS. Também parece firmar o estilo de “mockumentary” que hoje identificamos com o género e que seria depois desenvolvido por Christopher Guest (Harry Shearer, que co-escreveu o filme e contracenou com Guest em “Spinal Tap”, é também uma das suas figuras proeminentes). Porém, no final ficou-me a sensação de que há Brooks demais e de que a família filmada merecia mais tempo de ecrã.