FEMALE TROUBLE (1974)

Divine já era tão importante para a obra de John Waters e uma figura tão culturalmente marcante que o realizador fez-lhe a história de origem que ela merecia: absurda, e divertidíssima.

THE PINK PANTHER (1963)

Quando era miúdo, odiava os filmes da série "The Pink Panther", porque não conseguia acreditar que só tinham o desenho da pantera no início e depois se transformavam numa comédia policial que não interessava ninguém. Hoje, já penso diferente. Vê-se a Claudia Cardinale numa coprodução internacional gigante lançada no mesmo ano de "8½", vê-se o Peter Sellers a esbanjar brilhantismo e vê-se o Blake Edwards a dinamitar a estrutura teatral do policial clássico ("um hotel, cada pessoa no seu quarto, será que se vai descobrir quem é o criminoso?") com um ato final absolutamente delirante.

FORBRYDELSER (2004)

A estagnação do Dogma 95 não foi tão formal quanto foi temática. Os filmes do séc. XXI do movimento perdem a malícia agitadora de "Idioterne" e "Festen" (1998) e a "malaise" profunda de "Julien Donkey Boy" (1999). Parafraseando o manifesto do movimento, o cinema antiburguês tornou-se burguês ao preferir o melodrama amoroso ("Elsker dig for evigt", 2002) ou o neorrealismo ligeiro deste "Forbrydelser".

VARIAÇÕES (2019)

No ano passado, vi algumas polémicas na minha timeline do Facebook sobre este filme. Não entendo porquê. É um "biopic" musical bem escrito, bem realizado, bem interpretado. Ficaria bem na cinematografia de qualquer país. Porque não na de Portugal?

SALEM'S LOT (1979)

As histórias de Stephen King têm uma coisa bem "pé no chão", com o terror a aparecer num cenário realista e povoado pelas vontades e desejos das suas personagens. Nos livros, funciona muito bem, mas, como Kubrick bem sabia, é uma armadilha para as adaptações para audiovisual. Se se força a mão para um lado ou para o outro, acaba-se com uma obra incoerente e que não convence. Tobe Hooper não deixou que isso acontecesse nesta minissérie de culto e ainda teve a astúcia de citar Murnau e Hitchock, mas sempre sobra uma sensação de que, em audiovisual, o King bom é o King traído.

BORAT (2006)

Não me perguntem porquê, mas a primeira vez que vi "Borat" foi em Lisboa, numa projeção para comediantes e VIPs numa pequena sala da Castello Lopes. Eu não era comediante nem VIP, mas consegui um convite para ver essa pequena maravilha que insultou pessoas da América à Ásia Central. Nunca o tinha revisto além de umas cenas isoladas, mas hoje apeteceu-me uma comédia boa para soltar umas gargalhadas, e não estou a gostar muito das que me têm aparecido. Se tiverem sugestões, aceito!

TROLL 2 (1990) e BEST WORST MOVIE (2009)

No texto anterior, falei do Cinema enquanto encontro, e é precisamente isso que nos aparece aqui. "Troll 2" tem uma nota historicamente baixa no IMDB e isso resgatou-o da lata de lixo da História, onde estava junto com as tranqueiras que enchiam os catálogos de locadoras de vídeo, levando-o ao estatuto de culto. Como disse um crítico, o filme é mais estranho do que ruim. Nele não vemos um grupo unido de gente desajustada e divertida, como nos filmes de John Waters, nem somos constantemente assaltados pelo pensamento "como é possível que este somatório de sem-sentido exista e que eu o esteja a ver?", como em "The Room" (2003). "Troll 2" é um filme com atores muito desconfortáveis que interpretam cenas bizarras e dizem falas bem artificiais, mas ele tem uma história. É esse somatório de convenção com estranheza e ultraje que o levou a criar um público cativo, que o visita enquanto evento e que torna o documentário muito interessante enquanto documento de cinefilia. Acho que o essencial é: um filme verdadeiramente mau é o que não tem coerência estética, e "Troll 2" não sofre disso.

DIVINE TRASH (1998) e I AM DIVINE (2013)

O primeiro documentário conta como foi o início da carreira de John  Waters, com foco especial em "Pink Flamingos" (1972) e inclui imagens de "making of" inéditas até então. O segundo fala sobre a vida e carreira de Divine, incluindo o detalhe tristíssimo de ter morrido na véspera do trabalho que o levaria definitivamente para o mundo do entretenimento "mainstream". Estão disponíveis no Youtube, são uma delícia e mostram como a obra de John Waters funciona por convocar, não só o deboche (da moral, dos costumes, do Cinema, de si própria), mas também o encontro tanto de quem faz como de quem assiste.

CHEWING GUM (2015)

A primeira série de Michaela Coel não tem o "pathos" de "I May Destroy You" (2020), mas é das sitcoms mais engraçadas que vi nos últimos tempos. É inspirada na sua juventude num bairro de habitação social em Londres, e a ideia de comunidade — aqueles que nos rodeiam, quer queiramos quer não, para o melhor e para o pior — domina a história desta miúda evangélica que só quer amor e perder a virgindade. Divertidíssima.

VILLAGE OF THE DAMNED (1960)

Não sei se será por causa deste ano estranho, mas estou com pouquíssima paciência para coisas longas. Se, em 77 minutos, consigo ver um clássico da ficção científica com ecos metafóricos do nazismo e da Guerra Fria, tanto melhor!