BILL AND TED'S BOGUS JOURNEY (1991)

Ser divertido já não é pouco, mas acho que os filmes da franquia "Bill and Ted" têm um encanto especial porque, como os seus protagonistas, eles aparentam ser bem mais burros do que realmente são. De qualquer forma, se só quiserem ver uma comédia para rir um pouco, as citações de Bergman não vos vão distrair.

THE THIRD DAY (2020)

Esta série intrigou-me mais do que me fascinou. Ainda assim, intrigou-me tanto que a vi até ao fim, o que é mais do que se pode dizer sobre muita coisa. Apreciadores de "folk horror" vão ter interesse especial.

LA 92 (2017)

Documentário monumental sobre os motins em Los Angeles que se seguiram ao julgamento dos polícias que espancaram Rodney King. Composto só por material gravado e transmitido na época, o seu gigantesco trabalho de pesquisa mostra como as tensões sociais e a desigualdade são barris de pólvora sempre prestes a explodir. Depois de 2020, vê-lo é obrigatório.

SOCIETY (1989)

O filho adotado de uma família rica sofre de alucinações psicóticas e, das duas, uma: ou está tudo normal ou os seus pais e irmã entregam-se a orgias incestuosas e satânicas. "Body horror" trash com jeito de luta de classes: como não gostar?

YOU'VE BEEN TRUMPED TOO (2016)

Depois que obtivemos o resultado das eleições nos EUA, encontrei na Amazon Prime este documentário que conta como, para fazer o seu campo de golfe na Escócia, Trump e filho cortaram o acesso à água duma senhora de 90 anos e nunca mais o repuseram. Mostra aquilo que já todos sabíamos: que a nação mais poderosa do mundo, durante quatro anos, foi comandada por escória.

ON THE ROCKS (2020)

O novo da Sofia Coppola começa morno, tentando encontrar-se num território geográfico e narrativo próximo do de Woody Allen. Porém, quando Bill Murray entra, o filme transfigura-se. Não é apenas por ele ser um grande ator, mas por principalmente por ser uma criatura do Cinema, uma espécie de património performático ambulante que chega para reclamar o seu território. Mais do que um filme com Bill Murray, este é um filme do Bill Murray.

THE FUGITIVE (1993)

Revi-o um dia destes para desanuviar a cabeça. É a prova cabal de que, para ser comercial, um filme não precisa sacrificar a caracterização das personagens ao espetáculo. Na verdade, "The Fugitive" é tão honesto nas suas intenções que as confessa abertamente quando Harrison Ford diz "I didn't kill my wife" e Tommy Lee Jones responde "I don't care". Certo, a razão narrativa é que ele é um agente íntegro empenhado em cumprir a missão que lhe é atribuída, mas o subtexto é claro: se ele dissesse "ora, meu caro, acredito em você, vamos lá então cuidar desse problema", não teríamos o fascinante jogo de gato e rato que procuramos neste thriller.

NERUDA (2016)

Gosto dos filmes do Pablo Larraín, mas neste parece-me que o realizador ficou no meio, e isso não ajudou. Esta mistura da linha narrativa do fato e da biografia de Neruda com a da imaginação e do simbolismo deixou-me meio perdido, sem saber em qual chão pisava e com a sensação de que teria sido melhor ir para um lugar ou para outro. Filme bonito, mas falhou o alvo.

THE QUEEN'S GAMBIT (2020)

Sempre se poderia criticar esta série dizendo-a previsível, mas isso seria uma patetice. A sua grande genialidade é a forma como, a partir da personagem, une dois géneros — a história de desporto, à falta de melhor termo (como "Rocky" ou "Karate Kid"), e a "coming of age". O caminho da vitória para Beth enquanto jogadora de xadrez encontra-se com o que a leva a tornar-se uma mulher adulta e independente, às vezes da forma mais crua possível. Mais do que ver, é uma série que se devora.

I KNOW THIS MUCH IS TRUE (2020)

Se algum dia estiverem a procurar um melodrama recente, e não se importarem com ele contrariar as tradições do género, tendo como protagonista um homem de classe média-baixa, vejam esta série da HBO. O primeiro episódio é tão triste, tão triste, que cheguei a levar as mãos à cabeça. Acabamos por recuperar do baque inicial e o Mark Ruffalo está incrível a interpretar dois irmãos gémeos, mas, meu deus, nem um raiozinho de sol de vez em quando...

BORAT SUBSEQUENT MOVIEFILM (2020)

O novo Borat tem um final amarradíssimo, arma uma cilada monumental para o Rudy Giuliani e tenta ir além da caricatura dos seus "alvos" (por exemplo, os sujeitos que recebem Borat na sua casa são, ao mesmo tempo, teóricos da conspiração e defensores dos direitos das mulheres), mas a direção mais limpa não tem aquela tensão suja e caótica da do Larry Charles no primeiro filme. Além disso, quando o primeiro Borat saiu, estávamos no segundo mandato do George W. Bush e os absurdos nacionalistas e racistas dos EUA pareciam nunca terem sido explorados em humor daquela forma tão crua. O impacto então foi muito forte, mas, na era Trump, não só o radicalismo tomou o poder como é pauta diária e constante de todo o humor que se faz no mundo, incluindo a série "Who Is America?" do próprio Sacha Baron Cohen. O que antes era "cringe" agora é banal.

QUINCY (2018)

É um documentário realizado pela Rashida Jones, filha do músico, e dá tudo o que se poderia esperar dele: um acesso fenomenal, com cenas que outra pessoa não teria conseguido filmar, e também o tom hagiográfico de quem prefere mostrar o Quincy heróico ao Quincy controverso. Altamente recomendável para fãs do artista, de jazz e de música negra no geral.

THE HAUNTING OF BLY MANOR (2020)

Sobre terror, tenho um lema: se não me assustar, que me fascine; se não me fascinar, que me assuste; se não me fascinar nem me assustar, que me entretenha. Esta série cumpriu a última opção, ainda que, a dado momento, tenha parecido que começou a complicar sem necessidade aquilo que parecia simples.

LAZZARO FELICE (2018)

Será o filme mais bonito na Netflix? A momentos, lembrou-me o "Dom za vesanje" ("Vida Cigana" em BR, "O Tempo dos Ciganos" em PT) do Kusturika, mas, acima de tudo, fez-me pensar como o final da década de 2010 foi pródigo em filmes sobre os excluídos do capitalismo e como vários destes ("Bacurau", "Martin Eden") configuraram uma espécie de género próprio. Proponho até um nome: "neorrealismo mágico".

LARS AND THE REAL GIRL (2007)

Mais de dez anos depois, revi e confirmei aquilo que o torna um filme extraordinário. Não é só por mostrar que o Ryan Gosling é um ótimo ator, capaz de papéis memoráveis mesmo quando não faz um galã. É também por ser talvez o único filme que assumidamente dessexualiza a fetichização, mostrando-a como uma ferramenta que religa a pessoa ao mundo e permite que ela intervenha sobre ele e o reordene.

OPERAZIONE PAURA (1966)

Os filmes do Mario Bava são sempre fascinantes pela forma como, por trás da capa de escândalo e de "pulp", revelam um cineasta extremamente detalhista e técnico, com um domínio absoluto sobre as imagens que constrói e a capacidade de engrandecer uma cena com a sua câmara. A história misteriosa e o ambiente de terror gótico de "Operazione Paura" atraem, mas, no fundo, Bava segura-nos porque os filmes dele são, literalmente, para serem vistos.

THE TRIAL OF THE CHICAGO 7 (2020)

Gosto muito do Aaron Sorkin e, mesmo que não gostasse, um filme de tribunal escrito e realizado pelo homem que escreveu a frase "you can't handle the truth" é sempre de saudar. Nos seus "biopics", ele nunca foi um maníaco pela fidelidade às datas, por isso não vale a pena entrar na onda da verificação histórica. De resto, Sorkin entrega aquilo a que nos habituou: um bando de ótimos atores a interpretar personagens carismáticas com excelentes diálogos no contexto duma história política muito bem contada. Porém, tenho que dizer que o final me pareceu precipitado e sentimentalista, bem aquém do resto do filme.

DR. NO (1962)

O primeiro filme do James Bond é, ao mesmo tempo, adoravelmente "kitsch", mais próximo da aventura do que da ação e um festival de atrocidades neocoloniais que só poderia provir de um lugar que ainda tinha uma memória fresquíssima da queda do seu império. Bond, na verdade, revela tudo o que há de atroz na ideia de "gentlemen" britânico: branco, tão fluente nas sutilezas de salão quanto nas peripécias atléticas e uma espécie de farol imperialista que leva a tranquilidade da civilização às partes menos esclarecidas e tranquilas da Commonwealth. Se acham que estou a exagerar, revisitem e deleitem-se com este festival de "cringe".

DE PALMA (2015)

Nunca foi o meu preferido dos "movie brats", mas é inegável que o De Palma filma muito bem. Vocês sabiam que o primeiro filme do De Niro foi realizado por ele? Eu não!

LET THE RIGHT ONE IN (2008)

A primeira vez que ouvi falar sobre este filme foi numa palestra do Robert McKee na FNAC do Chiado, que precedeu o primeiro seminário que ele deu em Portugal. Ele elogiou o filme, dizendo que tinha sido dos últimos que vira que, no final, o fizera soltar um "uau". Seria injusto revelar todos os seus segredos aqui para quem não viu, mas é um filme que continuo a apreciar, principalmente pela forma como administra o subtexto ao longo de toda a sua duração. Adiantaria o seguinte: o resumo que se fez na época — "Twilight feito por Bergman" — é muito redutor: precisaria incluir o Sternberg de "O Anjo Azul" também.