RATCHED (2020) e ONE FLEW OVER THE CUCKOO'S NEST (1975)

Pode ser por "American Horror Story: Coven" ter esgotado a minha paciência para o Ryan Murphy, pode ser por ver os mesmos trejeitos narrativos e estilísticos a repetirem-se série após série, mas não acho que esta nova enfermeira Ratched seja comparável à personagem nada glamorizada e esvaziada de compaixão que Lousie Fletcher interpretou no filme clássico de Miloš Forman. Nalgumas coisas, definitivamente, menos é mais.

REPO MAN (1984)

Há dias, li sobre algum filme a crítica de que “tinha ideias demais”. “Repo Man” também tem. A sinopse do filme na Wikipedia descreve-o assim: «a 1984 American science fiction black comedy film (...). Set in Los Angeles, the plot concerns a young punk rock enthusiast who is recruited by a car repossession agency and gets caught up in the pursuit of a mysterious Chevrolet Malibu that might be connected to extraterrestrials». É muita coisa, cada uma mais inaudita do que a outra. Porém, por alguma razão, o filme funciona muito bem. Talvez seja o fato de tudo ser muito divertido e ter ótima música como fundo, mas eu acho que é porque ele deixa as ideias passarem sem se acumularem, transpondo o absurdo da sua premissa para a construção da sua própria narrativa. Às vezes, seria muito fácil dizer “isto não faz sentido algum”, mas isso seria cair na sua doce armadilha. É como se o filme nos dissesse “eu posso levar-me a sério – mas vocês não”. Não vejo a hora de o ver outra vez.

REAL LIFE (1979)

Uma bela comédia de Albert Brooks que, de certa forma, prevê o que seriam os caminhos futuros da “reality TV” numa época em que o único exemplar era a série seminal “An American Family”, da PBS. Também parece firmar o estilo de “mockumentary” que hoje identificamos com o género e que seria depois desenvolvido por Christopher Guest (Harry Shearer, que co-escreveu o filme e contracenou com Guest em “Spinal Tap”, é também uma das suas figuras proeminentes). Porém, no final ficou-me a sensação de que há Brooks demais e de que a família filmada merecia mais tempo de ecrã.

SCREAM (1996)

Parece impossível só ter visto “Scream” agora, mas a verdade é que, sempre que o apanhava na televisão, ele parecia-me “teen” demais e acabava por me desinteressar. Fiz um esforço para me concentrar e decidir finalmente se ele fica à altura de “Wes Craven's New Nightmare” (1994), um dos meus filmes de terror mais adorados de sempre. Percebi uma coisa: “Scream” não é exatamente um filme de terror. É claro que ele é realizado por um mestre imortal do género, é claro que ele é cheio de citações e é claro que ele é uma belíssima obra meta-narrativa. Porém, acho que lhe falta um elemento que considero essencial para dizer que algo é “terror”: o motor da sua narrativa não é a superação da normalidade interrompida por uma força que desafia a Razão, mas sim descobrir quem é o assassino. Ele não nos dá vontade de exclamar “sai daí”. Na verdade, nós queremos é que a Neve Campbell fique, para conseguir arrancar a máscara do sujeito que a atormenta. Ele não nos confronta com o absurdo e o medo, mas com a lógica do “whodunnit”, que nos leva a juntar mentalmente as pistas e tentar  descobrir o culpado antes da protagonista. De qualquer forma, fiquei muito contente por finalmente ter feito as pazes com o ótimo “Scream”.

RBG (2018)

Documentário sobre a falecida juíza Ruth Bader Ginsburg, com um foco curioso na forma como, em anos recentes, ela ganhou fama online e se tornou ícone da cultura popular. Respeitoso, mas interessante.

24 HOUR PARTY PEOPLE (2002)

Rever este filme provocou-me um movimento duplo da memória: o tempo que passou desde a sua estreia é mais ou menos o mesmo que o separava da “Madchester” dos anos 70-80 que retrata. Sempre fico um pouco melancólico quando me lembro dos cinemas Avenida em Coimbra, mas aqui a melancolia não dura muito, porque, mal começamos a ouvir Happy Mondays, a gente quer é dançar e ser tão feliz quanto o Bez.

GANJA & HESS (1973)

Um filme difícil de encontrar, cuja versão original só existiu, durante anos, numa única cópia guardada no Museum of Modern Art de Nova Iorque. É também um filme extremamente inteligente: o realizador Bill Gunn manipula os tropos da “blaxploitation” (violência, erotismo, crime) para, na verdade, construir uma história muito sofisticada sobre vício e assimilação cultural. Um apontamento final: se o fabuloso Duane Jones não tivesse morrido em 1988, hoje ele teria um estatuto comparável ao de Morgan Freeman.

APT PUPIL (1998) e 1408 (2007)

Duas adaptações honestas de Stephen King. Veem-se bem, apesar de nenhuma ser perfeita. “Apt Pupil” é muito eficaz ao montar um jogo de gato e rato que nos faz duvidar constantemente sobre quem é herói e quem é vilão. “1408” parece uma espécie de exegese dos temas em “The Shining”, mas ainda dá para dar uns pulos de susto  no sofá.

DAZED AND CONFUSED (1993)

Mereceria um lugar na história da cinefilia apenas por ser o primeiro filme em que Matthew McConaughey diz “alright, alright, alright”. Porém, é muito mais do que isso. Enquanto retrato geracional, poderia formar um díptico com o “American Graffiti” de George Lucas, feito vinte anos antes e sobre uma noite vinte anos anterior à que vemos aqui. Se considerarmos o quanto Richard Linklater gosta de abordar a passagem do tempo enquanto tema (“Boyhood”, a trilogia “Before”), talvez isso não seja apenas pura coincidência.

THE MIDNIGHT EXPRESS (1978)

Não sei se é por os últimos 40 anos de filmes terem mostrado prisões muito cruéis (“The Shawshank Redemption” vem-me imediatamente à mente só por mencionar o género), mas, sinceramente, não achei as prisões turcas assim tão más. O sistema jurídico, sim. De qualquer forma, pela forma como cria um Outro primitivo e incapaz de lidar com as suas próprias limitações, este é um filme modelo de olhar hegemónico norte-americano, não é?