Vivre Sa Vie (1962)

No musical Une Femme Este Une Femme, "Angela" era uma figura essencialmente da ilusão e do espetáculo. Aqui, "Nana", prostituta por não conseguir ser atriz, está antes do cinema, antes da ilusão. Ou será Nana a Angela depois de falhar os seus sonhos? Godard neorrealista, mas, acima de tudo, construindo e desvendando o fenómeno Anna Karina.

Beasty Boys Story (2020)

Spike Jonze filma Ad-Rock e Mike D lembrando o seu percurso, homenageando Adam Yauch e pedindo desculpas por um dia terem sido misóginos. Enternecedor e divertido, mas achei o hype exagerado. Don't believe the hype.

ECAL Instagram Live: Jean-Luc Godard (2020)

Há um mês, Godard foi entrevistado para uma live. Está velhinho e parece ter um Parkinson leve. Diz tranquilamente que está a perder a memória de curto prazo e e até já se vai esquecendo de algumas palavras. Mas ainda manda umas bocas ótimas.


Une femme est une femme (1961)

"Não sei se isto é uma comédia ou uma tragédia, mas, em todo o caso, é uma obra-prima". Godard engraçadinho.

How I Met Your Mother (2005)

Revi uns episódios da 1ª temporada ontem. Sempre defendi. Ainda é claro que, sob a capa de uma sitcom bobinha, é um grande artesanato sobre a arte de contar histórias. Porém, uma coisa sobressaiu: como a personagem do Ted é INSUPORTAVELMENTE chata.

Cheers, "The Boys In The Bar" (s01e06, 1983)

Durante a quarentena, terminamos Friends e, pelo meio, comecei a rever Cheers. Friends faz-me rir, mas Cheers é sitcom para gente grande. Pensem que este episódio sobre um ex-jogador de basebol que se assume gay passou na TV aberta americana em pleno início do pânico da AIDS. É um triunfo de coragem. Cheers tinha personagens de carne e osso em episódios que, considerando tudo, são peças de teatros de 2 atos. Toda a gente ali é meio falhada, meio melancólica, meio triste. Que série incrível.

À bout de souffle (1960)

Li uma vez que o primeiro do Godard tinha envelhecido mal. Discordo. É um filme com energia, luminoso, tão inconsequente quanto relevante. Ou seja, jovem para sempre..

Alphaville (1965)

Na distopia de Godard, quem se comportar de maneira ilógica é executado. 1/3 dos eleitores brasileiros já não se safava.

8½ (1963)

Fala-se muito de superação do neorrealismo, do bloqueio criativo de Fellini, etc, etc. Fala-se pouco de ser belíssimo. Eu diria mesmo "ó filme bonito do cacete, meu deus".

9 pensamentos sobre o especial de Natal Porta dos Fundos

(contém spoilers)

1. Pessoas como a minha avó, que dizia «graças a Deus, muitas, graças com Deus, nenhumas», têm o direito de não gostarem do especial de Natal Porta dos Fundos sem serem classificados como opositores da liberdade de expressão. Porém, cabe perguntar o porquê da ofensa. O especial "perturba a fé" das pessoas? Não consigo entender como uma doutrina construída ao longo de 2 mil anos e seguida por bilhões de pessoas pode ser "perturbada" por um especial de comédia de 44 minutos.

2. Fui educado católico: fiz a primeira comunhão, o crisma, anos de catequese e reconheço muito de bom naquilo que aprendi. Acho muito mais insultuoso, tanto para qualquer católico quanto para qualquer cidadão, que haja um crucifixo pendurado na parede do Supremo Tribunal Federal.

3. Por que há cocktails molotov atirados à Porta dos Fundos, mas não à porta do Vaticano quando se revelam os abusos sexuais por padres católicos? Ou à porta das igrejas evangélicas quando se revelam os abusos sexuais por pastores?

4. No especial, a dado momento, descobre-se que o namoradinho que Jesus terá supostamente arranjado é, na verdade, o Diabo. É uma perspectiva interessante, humorística, sobre os 40 dias que Jesus passou no deserto e as tentações que sofreu. Por que isto é ofensivo?

5. É ofensivo por sugerir que Jesus pode ser gay. No passado, já se disse que ele teve relações, casou, teve família (“A Última Tentação de Cristo”, “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”, “O Código Da Vinci”), mas dizer que Cristo é gay é dizer que ele pode ser sujeito de um desejo sexual que não implica a reprodução. Isso vai além de ele dizer que pode ser mulher ou negro; sugerir a homossexualidade de Cristo é como uma última fronteira de provocação.

6. Por isso é que a Porta dos Fundos acertou: ela expôs a hipocrisia no discurso público bem-intencionado. A partir do momento em que se admite ofensivo que Cristo possa ser homossexual, estamos a implicar que homossexuais não podem participar plenamente da dimensão do divino. E é exatamente pela mesma razão que em 2018 foi censurada a peça de teatro O Evangelho Segundo Jesus Cristo, Rainha do Céu, em que Renata Carvalho, uma atriz transexual, interpretava a figura de Jesus.

7. Porém, este texto se desviou do propósito até agora, porque o ataque à Porta dos Fundos só incidentalmente foi motivado por religião e provavelmente não teria acontecido se Duvivier e Porchat não fossem vozes ativas contra o governo Bolsonaro e representativas do pensamento progressista.

8. Um grupo terrorista de extrema-direita, herdeiro do fascismo integralista, fez este ataque para se lançar. Ele foi um crime, mas também um golpe publicitário. Ter sido cometido na véspera de Natal tem simbolismo, e também terá o motivo bem mais prosaico de ser um dia em que os criminosos sabiam que não estaria muita gente na produtora. Lembra um certo plano que um certo presidente teve uma vez de explodir os banheiros das vilas militares, sem machucar ninguém, só para mandar uma mensagem para o ministro que queria reajustar por baixo os soldos dos militares.

9. A conclusão é que o Brasil tem hoje um grupo terrorista de extrema-direita, católico e monarquista. Boa sorte em 2020.