fevereiro 2018

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O que é o FERIDO

Uma vez, vi uma entrevista ao Duke Ellington em que lhe fazem uma pergunta qualquer sobre "o seu povo". Avesso a deixar-se categorizar, um elegantíssimo Ellington divaga docemente. "O meu povo... qual dos meus povos? Estou em vários grupos. Estou no grupo dos pianistas, dos ouvintes..." . Entre outras hipóteses relutantes, ele diz que faz parte do "grupo dos que aspiram a ser diletantes". Se quiserem ver a resposta inteira, está aqui.

https://youtu.be/aAx_qsCjHiM?t=1h43m37s

Aquele eu que já então varava madrugadas vendo filmes de nacionalidades estranhas e vídeos em localizações recônditas, lendo ideias diferentes e tentando juntar palavras até fazerem sentido,  identificou-se totalmente com "o grupo dos que aspiram a ser diletantes". Diletante é o que se deleita, o que faz pelo prazer, o que estuda sem ter (e talvez porque não tem) um exame para passar.

Aconteceu que, há uns 6 meses, eu decidi compor uma música para dizer umas coisas que me pareciam precisar ser ditas. Tinha um microfone, tinha uma guitarra, tinha software, então, gravei mesmo. Depois, decidi fazer um vídeo. Peguei no celular, pressionei o "rec" e juntei mais umas quantas imagens que me pareciam apropriadas. Depois, era preciso lançá-la. Então eu pensei: já que estou a inventar uma música, porque não invento um músico? Pensei num nome, inventei um logo, criei um canal no YouTube e uma página no Facebook. E assim nasceu o FERIDO. Depois disso, tudo o que vou inventando ou copiando em música vai para lá, incluindo esta canção, que fiz para a minha terra natal depois que ela ardeu.

https://www.youtube.com/watch?v=NJKKVULPgsE&t=76s

Não sou guitarrista, mas, bem ou mal, gosto de tocar guitarra. Não sou produtor, mas, bem ou mal, gosto de gravar e editar. Não sou compositor, mas, bem ou mal, gosto de criar canções. Sou apenas um diletante, e quem quiser que ouça. Espero que gostem e, se quiserem, chamem para conversar.

Para você, o meu amigo que todo mundo desconfia ser gay, mas ninguém tem certeza

A gente nunca conversou sobre isso, porque pertence a cada um o querer falar sobre isso ou não.
No entanto, sem que chegue a seus ouvidos, o questionamento existe entre nós, seus amigos.
E não existe, repare, porque isso nos importe muito ou porque vá mudar profundamente as nossas vidas.
A grande verdade é que as pessoas são todas meio egoístas, e trabalhar o nosso próprio bem estar ocupa grande parte do nosso tempo.
Não é que nós sejamos assim, é o mundo que é.
Nós só coincidimos em existir nele.
Se outros mundos houvessem, talvez não fosse assim.
Elon Musk está aí, tentando levar-nos daqui para fora, quem sabe por essas razões.

Porém, há aqueles momentos do dia em que pensamos se aqueles de quem gostamos estarão bem e se poderemos fazer alguma coisa para estarem melhor.
E é nesse momento que pensamos em você.
Depende de você querer ser feliz ou não, e não vou ser eu a dizer que, para o ser, tem que andar por aí abrindo o cadeado do seu diário.
Pessoalmente, eu até acho que esse papo de felicidade é sobrevalorizado.
Se almoçou e jantou e dorme por baixo de um teto, já está melhor do que muitos.

Eu só gostaria que você entendesse que, se isso for importante para você, e se por acaso o seu silêncio sobre aquilo de que gosta, não gosta ou não sabe se gosta vem do medo de que os seus amigos resolvidos na heterossexualidade deixem de ser seus amigos, ou te deem uma palmadinha no ombro enquanto dizem "que bom que você falou" e depois se afastem porque não sabem mais como lidar com você, para já com isso.
A gente já sabe que nestas coisas não há normal. Como poderia, se não há norma? A gente já conviveu com tudo o que é matiz sexual, já flutou sobre todas as possibilidades da vida e, melhor ainda, a gente já é velho e sabe que todo mundo está fodido.
Todos temos que pagar impostos, o dinheiro é mais finito do que as contas por pagar, vamos ser idosos mais ou menos doentes e, pelo caminho, haverá pessoas nos desapontando, nós desapontando pessoas, e é assim mesmo.
Você falar "eu gosto de meninos", "eu gosto de meninas", "eu gosto de tudo" ou "eu não gosto de nada" não vai mudar isso.
As bocas estão por aí, os corpos junto com elas, e as leis que regem as atrações e os encontros são pormenores quando comparadas com a reforma da Previdência.

Ser seu amigo significa que, depois de resolvidas as nossas necessidades, o que a gente mais quer é te ajudar a ser feliz.
Devo te avisar que minha prima ficou solteira ou que meu primo ficou solteiro ou que ambos ficaram solteiros?
Eu não sei, porque eu nunca vi você com ninguém.
Se o que você quer é continuar o silêncio, porque você considera que a sua vida íntima é sua e eu não tenho nada a ver com isso, nem vou ficar me perguntando se você me considera menos amigo por nunca me ter falado sobre o assunto e evitarei para sempre o pensamento mesquinho e invejoso que talvez você tenha falado sobre isso com outro amigo mais merecedor.
Eu adoro o silêncio e, se o que te deixa bem é deixar as coisas assim, maravilha.
Mas, se você sempre quis falar algo e nunca soube como, fica à vontade também, rapaz.
Você vai me falar dos teus problemas e eu vou poder dar os meus conselhos.
Provavelmente, estarão errados, mas serão sinceros e virão com um abraço.

Então, deixa de neurose, tá bom?

Teu amigo,
Jorge.